Terça-feira.
Eu havia acabado de atualizar o blog e meu celular
tocou. Era uma amiga que sei que acompanha o blog e achei que a ligação era
para comentar alguma coisa.
Mas infelizmente não era...
Meu ar faltou de repente, e vi um filme de terror passar
diante de mim. Todas as lembranças dos dias de dor vieram a tona numa fração de
segundos. Senti uma mistura de raiva e dor. Mas graças a Deus, o sentimento de
desespero não durou muito.
Pratiquei um exercício que tem me ajudado bastante
que é repetir a mim mesma:
"Não depende de mim! Não depende de mim! Não
depende de mim! Se um dia tiver que acontecer de novo, não sou eu que serei
capaz de impedir!"
O esposo de outra companheira, que esteve internado
na mesma instituição que meu amor estava e recebeu alta cerca de um mês antes,
havia recaído e estava fora de casa desde o dia anterior. Foi uma notícia muito
horrível.
Ela teve bebê na semana passada, e eu só pensava
naquela mulher, com um anjinho recém nascido no colo tendo que passar por isso
tudo novamente.
Meu amor estava deitado no sofá enquanto eu falava
ao telefone e logo percebeu que havia algo errado.
Quando eu contei, ele apenas levantou-se, veio em
minha direção e me abraçou forte.
"Me deu um frio na barriga!"
Essa foi a única coisa que ele conseguiu dizer no
primeiro momento.
É um cara que ele considera um amigo de caminhada.
Meu bem ficou triste e calado por algum tempo. Ele
sabe que é muito difícil manter-se limpo, que se vacilar por um único instante,
a auto-suficiência grita dentro dele e a recaída é certa. Tive a impressão que
ele sentiu medo.
Eu, particularmente, acho que a sensação de medo, de
certa forma, pode ser ótima, pois ela funciona como um freio, que nos impede de
abusar da sorte.
A recaída não acontece de imediato. Na verdade, a
recaída vem bem antes, e pode ser detectada com a postura arrogante do adicto,
na dificuldade em manter-se submisso ao programa, na vontade de fazer as coisas
segundo seus desejos, enfim... Uma série de fatores que vão dando os sinais de
que o adicto já está recaído, e o ponto culminante se dá com o uso das drogas.
Às vezes ele tenta me explicar como funciona a mente
dos adictos, sobre como eles se auto-sabotam e procuram motivos em tudo para
justificar o que os levaram ao uso. E sempre há um porque'!
Minha noite de sono não foi lá grandes coisas,
sonhei o tempo inteiro com o casal, e eu o via usando drogas no sonho.
Para minha paz, meu amado me transmite uma confiança
e serenidade muito grande. Não que ele esteja sentindo-se auto-confiante, muito
pelo contrário, ele sabe muito bem o tamanho do seu problema e o que pode
acontecer se ele resolver tentar usar novamente.
Hoje ele diz que aprendeu a usar ferramentas para
identificar os sinais que podem despertar o desejo de usar, e, automaticamente,
ele já consegue converter as idéias de forma que os sentimentos ruins sejam
afastados. Ele procura sempre desviar o pensamento para relembrar o estado em
que estava antes de entregar-se ao programa.
"Eu procuro sempre lembrar de onde eu vim... De
tudo que estou reconquistando agora e que, se eu usar, vou perder tudo de novo..."
...
"Eu prestei atenção em cada palavra dita pelo
meu padrinho durante suas terapias. Eu tenho tudo gravado em minha mente. E
isso me ajuda muito, pois ele me deu muitas ferramentas para que quando o
sentimento venha, eu saiba como fazer para me livrar dele."
Ele tem consciência que não pode afastar-se do
programa, e que no dia em que ele achar que está ótimo', já é sinal de
recaída.
Nesta quarta-feira ele começou a trabalhar, e para
minha agonia inicial, fez plantão durante a noite, até as 9h de quinta feira.
As borboletas voltaram a bater as asas dentro do meu estômago, mas, dessa vez
foi de levinho e novamente, pratiquei o exercício para abandonar a
co-dependência.
Ele precisa recomeçar a vida dele, e assim será. Ele
tem que ter consciência de suas escolhas e das conseqüências que elas poderão
ter. E eu preciso aceitar que jamais vou ser capaz de contê-lo. A recuperação é
diária e depende apenas da boa vontade a da força de vontade dele!
Ele saiu de casa tão animado e ansioso para
recomeçar que deu gosto de ver.
Eu fui para a reunião do grupo Juntas Podemos Mais. Eu
também estava animada e feliz!
Por volta das 23h levei um lanche para ele. Ele
mostrou-me toda a clínica, os cachorrinhos que ele havia atendido e os
filhotinhos que nasceram (fofos).
Voltei para casa com o coração apertado e com um
certo receio. Além de ser minha primeira noite sem meu amor, imaginei-o sozinho
durante toda a madrugada e com dinheiro disponível.
Mas eu sei o quanto ele está valorizando as novas
conquistas. O quanto ele se importa com o proprietário da clínica, que é seu
amigo de verdade, e que se vacilar perderá tudo. Concentrei-me em sua
transformação e no milagre que tem sido sua vida. Voltei para casa e consegui
dormir tranquila durante toda a noite.
A esposa do proprietário do centro terapêutico
comentou na nossa reunião sobre como ficou impressionada com a transformação
vivida por meu amor. Que somente quem o viu quando chegou ele lá, e quando ele
saiu, é capaz de dizer.
Eu o amo! E estamos juntos... Só por hoje...
E por falar em Só
por hoje', uma companheira do grupo, que não vive a realidade da adicção,
mencionou na dificuldade que ela tem de compreender isso. Que não consegue se
imaginar vivendo apenas o HOJE. Que ela vive o PARA SEMPRE.
Tentamos explicar que o nosso SÓ POR HOJE funciona na base de um PARA SEMPRE...
SÓ POR HOJE escolho ser uma pessoa
melhor e mais feliz, e assim será PARA
SEMPRE!
Que viver assim, significa apenas viver da forma que
Deus nos ensina. Um dia de cada vez...
Que o AMANHÃ
está nas mãos de Pai.
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